Impactos do Coronavírus nas relações contratuais
A pandemia do Coronavírus (Covid-19) tem gerado diversas discussões em todas as áreas do direito, já que o vírus causa impacto no cotidiano de toda sociedade, nas mais diversas esferas, não sendo diferente nas relações contratuais.
Com o fechamento de shoppings e comércio de rua, adiamentos de shows e eventos, cancelamento de vôos, impossibilidade ou atraso de entrega de mercadorias, dentre outras situações causadas em razão das medidas adotadas pelo poder público para prevenção de disseminação do vírus, é evidente que surgirão dúvidas em relação ao cumprimento dos contratos frente aos problemas iminentes neste momento.
Além disso, há que se considerar que a pandemia trará, como consequência, impactos financeiros diversos, deflagrando uma provável crise financeira no país. Tal circunstância já vem gerando a suspensão e rescisão de muitos contratos, e poderá acarretar o ajuizamento de inúmeras demandas provenientes desta nova realidade nas relações comerciais.
A legislação brasileira prevê algumas normas especiais que dão o devido tratamento a casos como o que estamos vivendo agora, que geram acontecimentos imprevisíveis e extraordinários, tornando o cumprimento do contrato oneroso para uma das partes.
O Código Civil, em seu artigo 478, prevê “nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato”. De outra banda, o artigo 479 disciplina que “a resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato”.
Com ambos os artigos, buscou o legislador trazer maior segurança para as relações negociais, garantindo a possibilidade de resolução do contrato, ou até a modificação do mesmo, no curso de eventual demanda judicial.
O artigo 393, do mesmo diploma legal, por sua vez, ensina que “O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.”.
O referido dispositivo revela a exclusão da responsabilidade do devedor por conta de danos decorrentes de “caso fortuito” e “força maior”. No entanto, é importante lembrar que a legislação trata como caso fortuito e de força maior aquelas circunstâncias em que não eram possíveis prever, evitar ou , como é o caso daquelas enfrentadas por consequência do Covid-19.
da legislação pátria resguardar a possibilidade de resolução dos contratos em casos supervenientes, é forçoso salientar que o princípio basilar das relações contratuais é o da boa-fé contratual, sendo impraticável que as partes se aproveitem das previsões legais para se furtarem do cumprimento daquilo que foi pactuado.
das previsões legais já existentes, é imprescindível que a população, especialmente os consumidores, estejam atentos às regulamentações que vem sendo criadas com o objetivo de lidar com os problemas causados pela pandemia.
Abaixo, alguns exemplos de serviços sensivelmente afetados pelos impactos do coronavírus e as respectivas soluções que vem sendo adotadas até o momento:
- Educação
A portaria 343, editada pelo Ministro da Educação, possibilitou que as instituições de ensino substituam algumas disciplinas pelo módulo virtual, através da disponibilização de aulas na modalidade “EAD”. Ainda, é facultado que neste período, as instituições adotem o recesso, desde que a carga horária seja compensada em período posterior, não prejudicando o cumprimento do ano letivo, ou até mesmo antecipem o período de férias escolares de inverno.
- Passagens aéreas
Foi publicada em 18 de março de 2020, a Medida Provisória 925, que dispõe medidas emergenciais para a aviação civil brasileira em razão da pandemia da Covid-19. A MP determinou o prazo de 12 meses para reembolso do valor relativo à compra de passagens aéreas. No entanto, algumas companhias possuem medidas diferenciadas que podem ser mais vantajosas ao consumidor, como o reagendamento de viagens, por exemplo, com prazo a ser determinado pela própria companhia. Sendo assim, é importante estar atento ao site da empresa em que foi comprada a passagem.
- Preço abusivo
Com o aumento da demanda de alguns produtos específicos, como álcool e máscaras, seguidamente é constatado aumento abusivo nos preços destas mercadorias. Código de Defesa do Consumidor veda tal prática, conforme redação de seu artigo 39, inciso X, estando o PROCON atento a tais casos, com o reforço da fiscalização. Recomenda-se que, identificada conduta ilegal desta espécie, o consumidor formalize uma denúncia junto ao site do PROCON/RS[1], sendo passível a aplicação de multa à empresa infratora.
- Contratos de financiamento
Por determinação do Conselho Monetário Nacional (CMN), os principais bancos do país estão permitindo a suspensão do pagamento de financiamento de imóveis e automóveis pelo prazo de 60 dias, sem a incidência de multa e juros, sendo que as parcelas serão automaticamente adicionadas ao final do contrato, provocando o elastecimento do mesmo.
Neste momento de crise, é inevitável que as relações negociais sofram forte abalo, especialmente diante das inevitáveis consequências financeiras que serão experimentadas nos próximos meses. A recomendação é estar atento às possibilidades de negociação de dívidas e formas de cumprimento dos serviços contratados.
[1] Site para protocolo da denúncia: http://www2.portoalegre.rs.gov.br/procon/default.php?p_secao=30